domingo, 13 de março de 2011

O Mundo é de Quem não Sente

A condição essencial para se ser um homem prático é a ausência de sensibilidade. 
A qualidade principal na prática da vida é aquela qualidade que conduz à ação, isto é, a vontade. 
Ora há duas coisas que estorvam a ação - a sensibilidade e o pensamento analítico, que não é, afinal, mais que o pensamento com sensibilidade. 
Toda a ação é, por sua natureza, a projeção da personalidade sobre o mundo externo, e como o mundo externo é em grande e principal parte composto por entes humanos, segue que essa projeção da personalidade é essencialmente o atravessarmo-nos no caminho alheio, o estorvar, ferir e esmagar os outros, conforme o nosso modo de agir.
Para agir é, pois, preciso que nos não figuremos com facilidade as personalidades alheias, as suas dores e alegrias. Quem simpatiza pára. 
O homem de ação considera o mundo externo como composto exclusivamente de matéria inerte - ou inerte em si mesma, como uma pedra sobre que passa ou que afasta do caminho; ou inerte como um ente humano que, porque não lhe pôde resistir, tanto faz que fosse homem como pedra, pois, como à pedra, ou se afastou ou se passou por cima.

Fernando Pessoa, in 'O Livro do Desassossego'

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Ultimamente tenho lido muito Fernando Pessoa, essa minha constante metamorfose é a responsável por esta  linda descoberta.

sexta-feira, 4 de março de 2011

Integração e Acolhimento

Então, dando continuidade sobre o tema : Alemanha

Vou tentar escrever aqui de uma maneira simples e bem direta o que realmente acho/sinto e penso quando o assunto é INTEGRAÇÃO.

Na minha opinião, uma boa integração só começa realmente quando ambos interessados se ajudam, ou seja eu enquanto "migrante" estou disposta a aprender, conhecer e respeitar a cultura alheia, assim também deve agir o meu "Acolhedor", elaborando-criando-discutindo projetos, cursos, métodos e alternativas para as pessoas que por algum motivo especifico (trabalho,estudo,casamento) decidem-se migrar e começar muitas vezes do zero, uma nova vida ou um novo conceito de vida. Essas pessoas (eu), chegamos cheios de sonhos, desejos, projetos, ansiosas para conhecer pessoas e assim plantar uma sementinha de amizade, sentir-se "acolhida" à sua nova "Heimatland" . Mas nem sempre todas as expectativas  são correspondidas conforme o desejado-planejado-esperado. Aí, o bicho pega!!!

Novamente dando a minha opinião, nem sempre falar o idioma fluentemente garante que o processo de adaptação seja menos doloroso das  outras  pessoas que por algum motivo não chegarão AINDA  nesse      "nível" Além disso, o processo de adaptação não se resume apenas em : falar  ou não falar.

É muito mais abrangente, além do o idioma,  envolve comida,  roupas,  clima,  forma de ser, agir e pensar dos nossos novos vizinhos, colegas de trabalho, professores, religião, costumes, música, características físicas e biológicas. A fluência no idioma ajuda, mas ela por si só, não garante a tal sonhada e desejada integração.

Uma coisa é certa, integração exige diversidade, exige diálogo, exige carinho-respeito-amor,exige compromisso, exige convivencialidade, exige uma relação(casamento) com o outro, com o meio e principalmente consigo mesmo. De certa forma, pode se dizer que é um "contrato" onde ambas as partes devem cumprir os seus direitos e deveres. Se houver o não cumprimento, é mais do que natural que conflitos surjam e gerem um baita desconforto em ambas as parte.

Integração é uma luta interior, que automaticamente se estende para o exterior. É preciso que este exterior esteja preparado para este acolhimento. caso contrário, haverá uma rejeição, frustração, medo, isolamento, depressão, raiva, conflitos.  Viver e conhecer são mecanismo. Conhecemos porque somos seres vivos e isso é parte dessa condição. Conhecer é condição de vida na manutenção da interação ou acoplamentos integrativos com os outros indivíduos e com o meio, já dizia Maturana. Porque a integração só pode acontece quando o indivíduo e o seu meio conseguem interagir. Conseguem se comunicar, ensinando e aprendendo na mesma sintonia e freqüência. Sem esses " detalhes" a coisa não anda, não flui. 

Enquanto nós (migrantes) fingirmos que estamos adaptados, e o governo fingir que tem interesse em investir em projetos que viabilizem uma boa integração, surgirão muitos e muitos  Sarrazin's. Com seus livros cheios de rancor, racismo, anti-semitismo. Cheio de idéias mirabolantes e comparacöes absurdas!!!! 

Já passaram-se mais de 66 anos da segunda guerra mundial,  22 anos da queda do muro de Berlin e unificação das Alemanha's Ocidental e Oriental, ainda assim é possível sentir que nem todos os "muros" foram derrubados. Os que existem não são mais de tijolos, mas os invisíveis que causam o preconceito e dificultam o processo de adaptação e integração de muitos de nós, migrantes.

Enfim, nesse quesito a Alemanha ainda não conseguiu livrar-se dos fantasmas de um passado, em que eu espero sinceramente que jamais volte a acontecer.